sábado, 9 de outubro de 2010

Encontro possível

Conversavam como se fosse natural. Os dois corações palpitavam em acelerado ritmo, sabendo que de natural nada havia. Havia brilho nos olhares de forma recíproca. Sabiam da satisfação daquela conversa. Compartilhavam idéias, sonhos, aprendizados. As vozes doces e autênticas, as almas em sintonia.
Mas havia algo que não poderiam saber ao certo. Algo que ficava nas entrelinhas.  Havia o desejo. Dentro de cada coração, em cada pensamento, o desejo de mais. Desejo de um toque, desejo de um abraço... De carinhos, de beijos, de amassos... A imaginação correndo solta enquanto a realidade não a permitia expressar-se. De cada lado, a dúvida. A possibilidade de rejeição e, ao mesmo tempo, a sensação de que haveria retorno...
E as palavras continuavam sendo pronunciadas, eloqüentes, alegres e eufóricas. A troca era visível e gratificante. Mentes acima da média, que se completavam e frutificavam juntas. Liberdade.
E as risadas, como de duas crianças, rompiam o silêncio numa delicadeza que só aquelas duas almas poderiam compreender. E a primeira voz disse:
–  Bate aqui! – e mostrou a mão espalmada, no ar, como se pulsasse...
Tap!
E num impulso impensado, uma das mãos não quis se afastar da outra. E entrelaçaram-se os dedos.
E os olhos se encontraram novamente no silêncio por alguns instantes.
E outra voz disse:
–  Tudo isso é muito fascinante. Se eu pudesse ficava pra sempre aqui, no delírio dessa conversa e...
Lançou-lhe um olhar inadvertido, sem se conter mais. Mas não teve coragem de completar a frase. No pensamento, as palavras ecoavam: “... e com você.”
E o silêncio novamente emoldurou os olhos que brilhavam no encontro.
–  Eu entendi muito bem esse teu olhar... Tu não vais parar, não é? – disse a primeira voz.
Houve um leve baixar do olhar, que num segundo, voltou a buscar seu par.
­–  Eu sei... tu já tens compromisso com outro coração... há limites que não deveriam ser ultrapassados...
–  Será? E o que fazemos agora? – sorriu e ergueu uma sobrancelha. Aqueles olhos grandes e cativantes eram risonhos ao dizer –  Nós sabemos... já foram ultrapassados.
– Não me pergunte...
As respirações ofegantes aceleraram mais ainda seu ritmo. Os olhos não mais brilhavam, eles ardiam.
– Tem razão... Não há mais o que dizer.
E o silêncio reinou novamente, como já queria fazer.  As mãos continuavam unidas até então e assim ficaram. A outra mão levou os dedos até a boca que aguardava com uma sede especial.  Deslizaram pelos lábios macios. Os rostos se aproximaram, cada vez mais perto.
Lábios se encontraram. Deleite. E num beijo quente, tenso, ansioso e alucinado se perderam. Ou melhor, se encontraram, porque com amor nada se perde. As almas voaram livres, dançaram nos ares enquanto os corpos se largavam às sensações de êxtase. Não havia mais o contar do tempo, nem chão sob os pés para dar as coordenadas. Havia somente luz.


-Nina

*   *   *

2 comentários:

Daltro Simões Gama disse...

Muito bonito o texto. Mesmo. Para reflexão de valores, sexismo de lado, pode alguma das partes ser julgada de mal, sabendo-se que "já há compromisso com outro coração"? Pode alguma das partes ser julgada "fraca" por ceder, mesmo tendo "compromisso", ou "mal caráter", por lançar mão de tanta intimidade com alguém sabidamente "compromissado"?

Nina disse...

Boas perguntas, Daltro!
Quem somos nós pra julgar, não é? Nunca sabemos... Nosso telhado também é de vidro, certo?
; )