O Pequeno Príncipe
- Antoine de Saint-Exupéry
Assim, o principezinho, apesar da sinceridade do seu amor, logo começara a duvidar dela. Levara a sério palavras sem importância, e isso o fez sentir-se muito infeliz.
“Não deveria tê-la escutado”, confessou-me um dia, “não se deve nunca escutar as flores. Basta admirá-las, sentir seu aroma. A minha perfumava todo o meu planeta, mas eu não sabia como desfrutá-la. Aquela história das garras, que tanto me irritava, devia ter-me enternecido...”
Confessou-me ainda:
“Não soube compreender coisa alguma! Deveria tê-la julgado por seus atos, não pelas palavras. Ela exalava perfume e me alegrava... Não podia jamais tê-la abandonado. Deveria ter percebido sua ternura por trás daquelas tolas mentiras. As flores são tão contraditórias! Mas eu era jovem demais para saber amá-la.”
Creio que ele aproveitou de uma migração de pássaros selvagens para fugir. Na manhã da viagem, pôs o planeta em ordem. Revolveu cuidadosamente seus vulcões. Ele possuía dois vulcões em atividade. E era muito cômoda para esquentar o café da manhã. Possuía também um vulcão extinto. Mas, como ele dizia: “Nunca se sabe!” Revolveu também o extinto. Se são bem revolvidos, os vulcões queimam lentamente, constantemente, sem erupções. As erupções vulcânicas são como fagulhas de lareira. Aqui na Terra, nós somos muito pequenos para revolver os vulcões. Por isso é que eles nos causam tanto dano.
O pequeno príncipe arrancou também, não sem um pouco de tristeza, os últimos rebentos de baobás. Ele pensava nunca mais voltar. Mas todos esses trabalhos rotineiros lhe pareceram, aquela manhã, extremamente agradáveis. E quando regou pela última vez a flor, e se preparava para colocá-la sob a redoma, percebeu que tinha vontade de chorar.
- Adeus – disse ele à flor.
Mas a flor não respondeu.
- Adeus – repetiu ele.
A flor tossiu. Mas não era por causa do resfriado.
- Eu fui uma tola – disse finalmente. – Peço-te perdão. Procura ser feliz.
A ausência de censuras o surpreendeu. Ficou parado, completamente sem jeito, com a redoma nas mãos. Não podia compreender essa delicadeza.
- É claro que eu te amo – disse-lhe a flor. – Foi minha culpa não perceberes isto. Mas não tem importância. Foste tão tolo quanto eu. Tenta ser feliz... Larga essa redoma, não preciso mais dela.
- Mas o vento...
- Não estou tão resfriada assim... O ar fresco da noite me fará bem. Eu sou uma flor.
- Mas os bichos...
- É preciso que eu suporte duas ou três larvas se quiser conhecer as borboletas. Dizem que são tão belas! Do contrário, quem virá visitar-me? Tu estarás longe... Quanto aos bichos grandes, não tenho medo deles. Eu tenho as minhas garras.
E ela mostrava ingenuamente seus quatro espinhos. Em seguida, acrescentou:
- Não demores assim, que é exasperante. Tu decidiste partir. Então vai!
Pois ela não queria que ele a visse chorar. Era uma flor muito orgulhosa...
Palavras de sabedoria, que só as crianças, como o principezinho, sabem. As crianças não estão imersas no mundo das pessoas grandes, cheio de peso e medo. Vamos ouvir a delicadeza das crianças, é o que peço. Não vamos deixar que tudo se perca, que a dor seja maior, para aprendermos alguma coisa. Vamos tentar não ser tão pequenos para poder revolver os nossos vulcões.
Descobri que eu nunca soube amar. Minha paixão é insana. Pensei que eu havia aprendido, que eu havia crescido. Ledo engano. Quanto ainda precisarei me machucar para aprender o que é simples na vida?
- Nina
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